O que é Antropologia da Política? - Possibilidades da realização etnográfica sobre o repertório da política, por Álex Kalil

Obra: 'El Alma Nunca Piensa Sin Imagen' de Roberto Jacoby
Álex Kalil

A antropologia política tem seu cerne entre os anos de 1940 e 1950 no contexto do desenvolvimento da Antropologia Clássica[1]. Durante este período a disciplina passa por uma espécie de adequação cientifica. Os autores estavam preocupados com o rigor cientifico para definir as diferentes ordens sociais encontradas nas “sociedades primirivas”. Estes sistemas (Sistema de parentesco, sistema político, sistema religioso etc.), encontravam-se entrelaçados entre si de forma que a categorização destes era um meio, isto é, um método de análise etnográfica – como podemos ver nos trabalhos de Malinowski e Mauss.

Em meados dos anos de 1990 no Brasil surge um interesse etnográfico especifico e o estudo da política tem um novo tratamento etnográfico, alterando o sentido gramatical da denominação de Antropologia Política para Antropologia da Política. A mudança semântica também modificou a maneira como a antropologia olhava para a política, desta vez, a política é vista como objeto e não adjetivo, ou seja, passa a ser questionada. A política definida e legitimada pelos padrões ocidentais - que também são sistemas de valores - podem ser analisados e problematizados.
Logo, autores como Emile Durkheim e Max Weber e suas interpretações clássicas, tiveram que ser ressignificadas nas analises, entendendo a sociedade contemporânea e suas problemáticas sobre a terminologia utilizada por Durkheim de representações coletivas. Segundo Moarcir Pereira (1998), ”a idéia de que toda atividade social é atividade simbólica e de que as “representações coletivas” são a matéria-prima de não importa que domínio estava posta muito claramente para alguns dos “fundadores” da disciplina” (PEREIRA.M, 1998 p.14). O autor também argumenta que Durkheim tinha uma visão sobre o Estado moderno como um criador de representações para o coletivo e que a sua distinção em maior grau se dá devido o seu nível de “cosnciência e reflexão” (PEREIRA.M, 1998). O Estado seria um legitimador de significações e sentidos, para Clifford Geertz, haveria uma “luta pelo real”, ou seja, uma luta pelo monopólio das significações do mundo. Deste modo a categoria de política deveria ser analisada etnograficamente através do seu universo de significações, o seu universo histórico e cultural.

Para Pierre Bourdieu, esta dimensão estava inesperada da política e as “representações coletivas” da política estariam em jogo pela eficácia “simbólica” e “material” do mundo real. A interpretação de Bourdieu, embora traga um tratamento clássico da questão, nos abre vista para compreender que estas representações da política estão em constante disputa, buscando a sua eficácia nas crenças.

Assim, também podemos compreender que a ideia de política está em um domínio que se estende para outras atividades sociais, sendo religiosas, econômicas, educacionais, morais etc. Entende-la deste modo não implica negar a sua especificidade, mas sim reconhecer que ela está em outros modos e estes se intercruzam conformando a especificidade da Antropologia da Política, compreendendo a pluralidade de representações do real nas sociedades complexas.  

Podemos pensar aqui acerca da potência e abrangência desta disciplina aplicada as Sociedades Complexas e seus estudos sobre as manifestações simbólicas do poder. O poder político está muito atrelado ao poder simbólico, ele tem domínio de grande parte – não completamente – dos meios pelos quais estes símbolos se expressam, podendo transformar o mundo social e o senso comum, ou seja, o modo como é experiênciado o próprio mundo social. O poder simbólico se manifesta a partir da capacidade de fazer ver e fazer crer, ou seja, fazer conhecer e reconhecer (BOURDIEU, 2015). A partir da abordagem de Moacir Pereira, inúmeras instituições, movimentos políticos, mídias digitais, dentre outros agentes construtores de hegemonia. Porém, os processos de construção e legitimação desses símbolos de poder também dependem de um movimento contrário, assim podemos pensar como a população e o senso comum também interage na construção e não apenas na absorção da atuação deste poder. São nas Representações coletivas desses indivíduos que o poder simbólico é construído. Ao entendermos também por este prisma, é indispensável pensar na subjetividade dos indivíduos, carregadas de significações diferentes e, portanto, influenciam no modo como estes símbolos são construídos de acordo com a aceitação individual, ou seja, a ideia de fazer parte de algo (MAFFESOLI, 2001).


O reconhecimento dessas forças e posições permite que pensemos as diversas representações da política. É indispensável a analise da política, tanto centrada nela mesma como também nas formas em que os sujeitos definem a mesma. Uma aproximação das categorias e práticas do mundo social.




[1] Aqui estamos considerando o período da antropologia clássica a partir de 1850 à 1960, isto é, do evolucionismo até o estruturalismo. 

Referências bibliográficas 

BOURDIEU, Pierre. A produção da crença: contribuição para uma economia dos bens simbólicos. 3ed. Zouk, 2014.
KANT, Immanuel; Crítica da razão pura. 1980.
MAFFESOLI. M O imaginário é uma realidade. Revista Famecos, Porto Alegre, n. 15; p. 74-82; ago. 2001. Entrevista concedida a Juremir Machado da Silva.
PALMEIRA, Moacir. Uma antropologia da política: Rituais, representações e violência. NuAP – Cucleo de Antropologia da política, 1998.

Comentários